Nota do Movimento pela Base sobre os 100 dias de Governo Bolsonaro

 

O Governo Bolsonaro chega aos 100 dias sem uma estratégia para a Educação brasileira. Paralisado por disputas ideológicas e uma crise de gestão, o MEC pouco avançou em políticas estruturantes para a área.

Abraham Weintraub, que substituiu Ricardo Vélez no comando da pasta na segunda-feira (08/04), precisará montar uma equipe capaz e disposta a abandonar o diversionismo ideológico para dar conta das prioridades reais da pasta, aquelas que afetam diretamente o aprendizado de milhões de crianças e jovens de todo país. Entre elas, o apoio aos estados e municípios, que têm pela frente o mandato, a oportunidade e o desafio de implementar a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) em todas as redes de ensino.

Das 35 prioridades para os primeiros 100 dias estipuladas pelo governo, quatro estavam ligadas à educação: o lançamento de um  programa nacional de alfabetização (a única sob responsabilidade do MEC); elaboração e disseminação de uma agenda de promoção da ética e da cidadania a ser adotada em salas de aula (sob tutela da Controladoria Geral da União); regulamentação do direito à educação domiciliar (Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos) e o lançamento do programa Ciência na Escola, para promover a interação entre universidades e escolas públicas (Ministério da Ciência e Tecnologia, em parceria com o MEC).

Todas se relacionam com o aprendizado, mas, das que caminharam até a publicação desta nota, apenas uma faz referência à BNCC – que determina os direitos de aprendizagem de todos os alunos da Educação Básica. E deveria fazer. É papel da BNCC ser a grande articuladora do sistema educacional, e sua observação é um dos quesitos para ajudar a garantir objetivos como a equidade educacional e a melhora do aprendizado.

Em março, o MEC anunciou uma Política de Alfabetização, que “servirá como marco legal a partir do qual decorrerão os programas e ações para atingir diferentes públicos-alvo, desde a educação infantil até os primeiros anos do ensino fundamental”. A política, que ainda não está em execução, não faz referências à BNCC, que determina o que e quando as crianças precisam aprender e desenvolver na leitura e escrita. Não cabe à BNCC ou ao MEC definir metodologias de ensino.

Da mesma forma, o programa de Ciências para as escolas públicas, por exemplo, lançado em fevereiro, “vai inserir a ciência e a tecnologia no cotidiano dos estudantes, aprimorar o trabalho dos professores para o ensino de ciências em sala de aula”. Mas não explica como isso será alinhado ao que diz a BNCC para esse componente.

No caso da Educação Domiciliar, o projeto de lei lançado em 11/04 (após a primeira versão desse posicionamento) a BNCC foi considerada, o que é um aspecto positivo, já que todas as crianças e jovens têm direitos iguais de aprender. Há, no entanto, inúmeros pontos de atenção no projeto de lei, que determina que caberá aos pais elaborar um Projeto Político Pedagógico (PPP) alinhado à BNCC e delega ao MEC a responsabilidade de aprovar esses PPPs, além de aplicar provas periódicas para avaliar se estão aprendendo o que deveriam.

Para além das prioridades dos 100 dias, a BNCC precisa avançar em diversas frentes de implementação, processo liderado por estados e municípios, mas que depende de apoio do governo federal.

Neste ponto, um passo importante foi dado pelo MEC em abril: a retomada do ProBNCC, programa de apoio financeiro para as redes estaduais e municipais darem continuidade à implementação, em regime de colaboração, das etapas da Educação Infantil e Ensino Fundamental (iniciada em 2018) e começarem a implementação do Novo Ensino Médio, que este ano tem o desafio de construir seus currículos. A medida não apenas reforça o caráter da BNCC como política de Estado, como também reconhece os esforços de professores, gestores, técnicos, especialistas e da sociedade civil na construção e implementação coletiva dessa política.

Há, no entanto, avanços importantes que ainda precisam acontecer para garantir que a BNCC chegue às salas de aula a partir de 2020 (Educação Infantil e Ensino Fundamental) e 2021 (Ensino Médio). Por exemplo, o MEC precisará avaliar com agilidade as propostas de trabalho encaminhadas pelos estados para a liberação dos recursos.

Outras políticas indutoras da implementação da BNCC também precisam ser pensadas e retomadas. A Base de Formação Docente, o referencial da formação inicial dos professores, que já havia sido encaminhada ao CNE, voltou para o MEC na gestão Vélez e está parada. Será preciso muito foco nas avaliações externas, como o Enem e o Saeb, para que suas matrizes sejam alinhadas ao que determina a BNCC e de fato avaliem a qualidade do que será ensinado na escola. Da mesma forma, o programa de livros didáticos precisa acompanhar o avanço dos novos currículos e da formação continuada dos professores, para que os alunos tenham acesso aos conhecimentos essenciais da BNCC em sala de aula.

Os desafios são grandes e urgentes. O Movimento pela Base espera que o MEC cumpra seu papel de zelar pelo direito de aprender com qualidade garantido pela Constituição e pela BNCC a todos os alunos brasileiros.